Paro na esquina e olho para o prédio que conheço como a palma da mão. Estar ali era compulsão, o alimento num hábito diário que sempre me levou porta adentro mesmo que, antes tivesse a necessidade de ver o que passava lá dentro através de um dos muitos retângulos de vidros duma complexa armação de madeira. Sim, era essa a fachada, toda envidraçada e que causava ótima impressão vista de fora. Portanto, após verificar que não havia movimento no interior, entrei.
Olho para o relógio e ele diz que faltam dois minutos para as nove horas quando cumprimento o sujeito que está atrás do balcão. Ele me olha com expressão de enfado, essas do tipo; lá vem o mala, mas como não sou um sujeito que não se abate com pouco escolho uma banqueta logo à sua frente e peço a minha bebida favorita. Provavelmente estejam questionando o que pode estar fazendo um sujeito cinquentão num lugar daqueles e nessa hora. Bem... deixar de estar ali se tornou impossível, pois não imagino o meu dia longe dali e das bebidas que tripudiam de minha alma mais que a meu próprio corpo. Claro, é hábito, e o que dele deduzo é que o vício tem a propriedade de encarcerar o homem nas paredes cinzas do seu EU, deixando apenas à mostra um pequeno visor para que possamos ter a dimensão do que se passa la fora.
É verdade também que algumas coisas naquele bar me mantem calmo, relaxado, assim como a parca iluminação que me remete num clima “noir” como os filmes da década de 50 estrelados por Humprey Bogart. Sim, me eram fatores desafiadores, mas como não pretendo ser herói de nada jogo um pouco de conversa fora com o sujeito do balcão e depois procuro uma mesa mais ao fundo. Escolhida, sento e retiro o notebook de 14 polegadas da minha pasta 007 imitativa do couro. Pronto! Era o que necessitava para percorrer o meu calvário, o ponto de partida à caça das palavras e ideias que conseguissem deixar o mundo das letras de pernas para o ar, quem sabe estaria nascendo ali uma obra literária das boas, quiça um best-seller. Todavia fiquei olhando para as teclas e elas mudas nada disseram. E isso me obrigava a refletir o quanto me sentia endurecido, talvez um caso para o tratamento de choque tal qual o bife de segunda que necessita ser amaciado por um apetrecho especial. Essa era a realidade, e eu necessitava, mais que nunca exercitar o poder de criação, voltar a fazer arte, pois o que escrevi num passado distante jamais foi arte, e serviu apenas à poucas centenas de universitários que exalaram dos meus livros apenas o odor do álcool e do perfume barato nos quartos de prostituição.
Ainda sobre as reminiscências do vício e dos viciados, é certo que no mundo das chapações o álcool é a droga lícita. E sobre o álcool afirmo que tudo se faz engodo, e eles dizem - "Beba com moderação" - "Ao beber não dirija" - E aí está a grande farsa, pois se estivessem preocupados com a nossa saúde ou sanidade proibiriam as indústrias da bebidas e pagariam o nosso tratamento em clínicas de reabilitação. Entretanto isso não importa ao governo, e o que conta são os altos impostos pagos, mesmo que reconheçam que o álcool estará devorando teus miolos com maior rapidez que te inutilizará o fígado.
Enfim, é isso, e a bebida e o bêbado são máculas da sociedade, e nada que deve ser renegado, nem os exageros que cometemos, apesar que, pessoalmente, me sinto recriminado pelo bom senso quando ele me na posse de alguma lucidez. E os seus protestos são duros, pois o bom senso detesta te ver exposto às situações ridículas, como nas vezes que, embrigado abandonava a mesa e me dirigia a jukebox empurrando fichas no seu interior até fazê-la vomitar um tango de Carlos Gardel. Não, não é o que pensam, não sou saudosista ou apreciador de tangos, aliás, nem deles eu gosto, Todavia ainda criança ouvia os programas de rádio junto de meu pai, e o carismático Gardel cantava sua voz anasalada, e aquilo sempre me impressionou.
Assim, ao começar a música eu caminhava trôpego para o meio do salão e ali me rendia às infindáveis tentativas de bailar o tango. Certo também é que por vezes surpreendia, e as pessoas acreditavam que eu iria até o fim, porém o álcool com sua personalidade devastadora fazia colidir as minhas pernas estatelando-me ao chão. Eram horas que me sentia na pele assim dum boxeador castigo duramente na região da cintura, e lá do chão eu olhava para o alto como se esperasse a ajuda de Deus, entretanto o Todo Poderoso nunca me levou a sério e me largava na própria conta. E ainda no chão o ar parecia faltar, mas não queria me ver derrotada, e tentava levantar, e em algumas ocasiões quase que consigo, mas na maioria das vezes precisei da ajuda dos braços dos clientes para novamente estar em pé.
No entanto passado o constrangimento o que cravavam em mim era a marca do idiota, um sujeito selado selado á ferro quente que se oferecia ao escárnio das pessoas, mesmo que estas soubessem que haveria condescendências para mim, afinal ao escritor tudo é permitido, e eu sou um escritor.
Sim, igualmente sei que sou polêmico, melhor dizendo, somos todos polêmicos. E a polêmica retira o estilingue das nossas mãos e nos transforma na vidraça que se estilhaça às críticas, pois senso comum é conceituarem-nos o pelo local que frequentamos, com quem andamos, ou pelos atos que cometemos. Assim, aprendi que tanto faz o ódio ou o apreço que nutram por mim, e estar ali ou num bordel seria perfeitamente suportável e normal assim como são os suores frios deixados em cadeiras de dentistas. Também é bom estabelecer que não pretendo ser revolucionário de nada, não sou do contra e nem pratico a discriminação com os ditos “normais” pois se me dissessem que naquele momento pessoas estariam bebendo café, leite, sucos, deglutindo frios, frutas e croissant, acharia tudo absolutamente normal, apesar do nó no estomago só ao pensar.
Olho para o relógio e ele diz que faltam dois minutos para as nove horas quando cumprimento o sujeito que está atrás do balcão. Ele me olha com expressão de enfado, essas do tipo; lá vem o mala, mas como não sou um sujeito que não se abate com pouco escolho uma banqueta logo à sua frente e peço a minha bebida favorita. Provavelmente estejam questionando o que pode estar fazendo um sujeito cinquentão num lugar daqueles e nessa hora. Bem... deixar de estar ali se tornou impossível, pois não imagino o meu dia longe dali e das bebidas que tripudiam de minha alma mais que a meu próprio corpo. Claro, é hábito, e o que dele deduzo é que o vício tem a propriedade de encarcerar o homem nas paredes cinzas do seu EU, deixando apenas à mostra um pequeno visor para que possamos ter a dimensão do que se passa la fora.
É verdade também que algumas coisas naquele bar me mantem calmo, relaxado, assim como a parca iluminação que me remete num clima “noir” como os filmes da década de 50 estrelados por Humprey Bogart. Sim, me eram fatores desafiadores, mas como não pretendo ser herói de nada jogo um pouco de conversa fora com o sujeito do balcão e depois procuro uma mesa mais ao fundo. Escolhida, sento e retiro o notebook de 14 polegadas da minha pasta 007 imitativa do couro. Pronto! Era o que necessitava para percorrer o meu calvário, o ponto de partida à caça das palavras e ideias que conseguissem deixar o mundo das letras de pernas para o ar, quem sabe estaria nascendo ali uma obra literária das boas, quiça um best-seller. Todavia fiquei olhando para as teclas e elas mudas nada disseram. E isso me obrigava a refletir o quanto me sentia endurecido, talvez um caso para o tratamento de choque tal qual o bife de segunda que necessita ser amaciado por um apetrecho especial. Essa era a realidade, e eu necessitava, mais que nunca exercitar o poder de criação, voltar a fazer arte, pois o que escrevi num passado distante jamais foi arte, e serviu apenas à poucas centenas de universitários que exalaram dos meus livros apenas o odor do álcool e do perfume barato nos quartos de prostituição.
Ainda sobre as reminiscências do vício e dos viciados, é certo que no mundo das chapações o álcool é a droga lícita. E sobre o álcool afirmo que tudo se faz engodo, e eles dizem - "Beba com moderação" - "Ao beber não dirija" - E aí está a grande farsa, pois se estivessem preocupados com a nossa saúde ou sanidade proibiriam as indústrias da bebidas e pagariam o nosso tratamento em clínicas de reabilitação. Entretanto isso não importa ao governo, e o que conta são os altos impostos pagos, mesmo que reconheçam que o álcool estará devorando teus miolos com maior rapidez que te inutilizará o fígado.
Enfim, é isso, e a bebida e o bêbado são máculas da sociedade, e nada que deve ser renegado, nem os exageros que cometemos, apesar que, pessoalmente, me sinto recriminado pelo bom senso quando ele me na posse de alguma lucidez. E os seus protestos são duros, pois o bom senso detesta te ver exposto às situações ridículas, como nas vezes que, embrigado abandonava a mesa e me dirigia a jukebox empurrando fichas no seu interior até fazê-la vomitar um tango de Carlos Gardel. Não, não é o que pensam, não sou saudosista ou apreciador de tangos, aliás, nem deles eu gosto, Todavia ainda criança ouvia os programas de rádio junto de meu pai, e o carismático Gardel cantava sua voz anasalada, e aquilo sempre me impressionou.
Assim, ao começar a música eu caminhava trôpego para o meio do salão e ali me rendia às infindáveis tentativas de bailar o tango. Certo também é que por vezes surpreendia, e as pessoas acreditavam que eu iria até o fim, porém o álcool com sua personalidade devastadora fazia colidir as minhas pernas estatelando-me ao chão. Eram horas que me sentia na pele assim dum boxeador castigo duramente na região da cintura, e lá do chão eu olhava para o alto como se esperasse a ajuda de Deus, entretanto o Todo Poderoso nunca me levou a sério e me largava na própria conta. E ainda no chão o ar parecia faltar, mas não queria me ver derrotada, e tentava levantar, e em algumas ocasiões quase que consigo, mas na maioria das vezes precisei da ajuda dos braços dos clientes para novamente estar em pé.
No entanto passado o constrangimento o que cravavam em mim era a marca do idiota, um sujeito selado selado á ferro quente que se oferecia ao escárnio das pessoas, mesmo que estas soubessem que haveria condescendências para mim, afinal ao escritor tudo é permitido, e eu sou um escritor.
Sim, igualmente sei que sou polêmico, melhor dizendo, somos todos polêmicos. E a polêmica retira o estilingue das nossas mãos e nos transforma na vidraça que se estilhaça às críticas, pois senso comum é conceituarem-nos o pelo local que frequentamos, com quem andamos, ou pelos atos que cometemos. Assim, aprendi que tanto faz o ódio ou o apreço que nutram por mim, e estar ali ou num bordel seria perfeitamente suportável e normal assim como são os suores frios deixados em cadeiras de dentistas. Também é bom estabelecer que não pretendo ser revolucionário de nada, não sou do contra e nem pratico a discriminação com os ditos “normais” pois se me dissessem que naquele momento pessoas estariam bebendo café, leite, sucos, deglutindo frios, frutas e croissant, acharia tudo absolutamente normal, apesar do nó no estomago só ao pensar.
Enfim, tudo, inexoravelmente tudo será passível nesse mundo de Deus, até o fato de eu ser o único bêbado naquele bar. Aliás, minto, eu não estava só, pois havia a mulher acomodada numa mesa mais adiante. Bato os olhos nela e talvez ela estivesse na casa dos 43 ou 44, e logo percebi suas pernas grossas e fartos cabelos negros. Curioso, olhei-a com atenção e a notei otimamente vestida num blazer e saia, cinza. No pescoço circundava uma echarpe rubra e de tecido leve, e isso lhe conferia certa sofisticação. Evidente, me foi possível observar as suas pernas porque elas estavam desnudas em 10 ou 12 centímetros acima dos joelhos. Inspecionando-a melhor pareceu-me estar numa espécie de transe onde o olhar se perdia num ponto obscuro do passado. Ainda mais instigado pela curiosidade aproximo de sua mesa e lanços os olhos para o chão como se procurasse por algo perdido. E é nesse caminho que ergo o meu rosto e estou tão próximo que percebo como são bonitos os olhos negros num rosto que se adorna nas linhas suaves apesar das poucas rugas. Porém no frigir dos ovos o que me impressiona nela é a sensualidade dos seus densos lábios tingidos por um batom avermelhado. Afixo-me neles e era como pedissem para serem tocados.
Ainda vivia o a tensão dos terrenos desconhecidos quando repentinamente seus olhos avivam, e ela lança o olhar para o teto e balbucia algumas palavras esparsas e depois frases completas. Não que me fossem todas audíveis, mas, as entonadas com contundência foram as que consegui ouvir com maior clareza. A voz parecia golfar dores e lamentos:
- Cara, por que teve que fazer isso? Por que tinha que ser assim? – Era o que questionava. Suas palavras esfaqueavam o ar como se fosse a chaga de um mundo mau.
Depois gesticulou as mãos espalmando-as para frente, empurrando alguém imaginário, evitando sua aproximação. Observo e tento ser discreto, no entanto foi impossível não sorrir, afinal eu reconhecia os loucos, e ali estava um, já que era pródigo ao aproximá-los. Falar sobre a insanidade sempre me foi apaixonante assim como suportável a sua inevitável e pública demonstração. Tenho cá com meus botões que é terrivelmente enfadonho passar pela existência sem jamais termos optado por ela, mesmo que por momentos.
-O que está olhando com essa cara de tolo? O senhor me causa repulsa com esses seus olhos loucos e indecentes! – Ela exclama á queima roupa – Estranhei, pois mal começara a beber.
A rudeza da constatação me pega de surpresa, no entanto sou vivido e a enfrento ao concentrar-me em seu olhar altivo, superior, talvez filho bastardo dum autoritarismo que nela parecia prenunciar. Por instantes permaneço reflexivo, pois há verdades que jamais sucumbem, tal como a necessidade que o louco tem em te fazer sentir que és mais louco que ele. E assim afirmo porque também além dos traços da loucura me é usual o mesmo tipo de padrão comportamental. Em suma era esse o caso, e aquilo me irritou, e tinha urgência de me posicionar, afinal fora mencionado de modo depreciativo pelas questões da mulher
-Olha dona, vai me desculpar, mas não me julgo indecente e nem tão pouco bobo ou louco! É bom que saiba que estava apenas observando – Respondi de forma pausada e reticente tentando demonstrar a opulência do equilíbrio emocional. Claro, menti, apesar de que a mentira jamais foi privilégios dos bêbados, drogados, ou mesmo, dos tão unicamente loucos.
-Observando é? Sei... – Devolve com a mesma reticência, alem duma generosa dose de pouco caso. Estranho, algo nela me levava às salas duma Universidade.
Em seguida desativou o olhar de mim e se concentrou à mesa na procura de deficiências na madeira até identificar pequenos orifícios, os quais os alargou escavocando com o grampo dos cabelos. Até aí tudo bem, pois recordo que sempre fiz das minhas ao estar ébrio. Rememoro que ali mesmo e há muitos anos costumava subtrair os rótulos das cervejas, e molhando-os juntamente como essas bolachas de papelão que se fazem suporte, os arremetia para o alto na tentativa de colá-los no teto. Sim, eram momentos de expectativas e dificuldades, mas, depois de alguma insistência conseguia o objetivo com o “ lance perfeito” E la estava ele selado ao teto, e me sentia vitorioso qual o americano que cravou a bandeira no lua. Depois de tanto esforço e sucesso tudo era motivo de festa, e eu volteava o banco concretado ao piso como um guerreiro indígena conclamando seu povo à luta. E então eu ria e gargalhava, e não me amedrontava com a cara de poucos amigos do Sr. Finley que, diga-se, jamais deixou passar passar em branco:
-Além de bêbado o senhor é uma cabeça de vento! Não percebe que não é mais um garoto? -Protestava formal, mesclado entre o português no seu inglês.
Ah sim, falemos do Sr. Finley, o dono do bar. Natural da Inglaterra estava há 25 anos no Brasil, e há 20 adquirira o estabelecimento. Lembro das datas porque fui marinheiro de primeira viagem naquele bar, antes um reles boteco, depois transformado num tipo de Pub que, segundo o Finley seguiu o padrão dos bares de Nottingham, sua cidade natal. Portanto eu estava acostumado às contestações do Sr. Finley antes meus bailados e rótulos, ocasiões que, munido da severidade no olhar tentava me amedrontar. Claro, era pura besteira e perda de tempo, pois decorridos alguns minutos terminava por sorrir-me compreensível, afinal os donos de bares que não compreendem ou aceitem a loucura jamais obterão sucesso nos negócios, e ele assim como tantos outros donos de bares nunca desconheceu o fato.
Bem, depois depois desses videotapes mental e da curta e ríspida conversa
com a moça autoritária permaneço no silêncio e sorvo lentamente a minha dose de Smirnoff. Tudo parecia voltar à realidade e me preparava para retornar ao
balcão quando, novamente a mulher se manifesta. Dessa vez o seu olhar e dedo
indicador apontavam para mim.
-Por acaso o senhor já se apaixonou por alguém 25 anos mais jovem? – Surpreso a olho e ainda vejo loucura em seu olhar. Agora sim a ficha caia e tudo fazia sentido ao poder compreender os motivos da agressividade.
Fiquei pensativo por alguns instantes, não que isso denunciasse em mim alguma paixão por uma jovenzinha de sorriso malicioso ou de bumbum empinado, não, ao contrário. O que fazia mergulhar nos pensamentos era a questão humana e as concernentes a ela. E um termômetro apontava que aos 25 anos o homem não atina para o fato de que após decorrer 20 ou 25 anos poderá dar de cara com uma guriazinha que acaba de ser parida numa maternidade qualquer. Avanço no raciocínio e a temperatura sobe ao chegarmos nos 35 do homem enquanto a garotinha brinca com suas bonecas aos 10. O que se falar sobre isso? Nada, salvo concluir que ela tem a idade para ser uma linda sobrinha. Porém a temperatura avança e tais diferenças começam desaparecer quando o homem atinge os 45, e que nessa idade veria a tal garota, agora aos 20, com um olhar diferente, pecaminoso até, ainda mais diante duma devastadora minissaia, moldura perfeita para um bem torneado par de pernas juvenis. Todavia e apesar das inquietações que a garota possa estar causando ainda se vê adepto das mulheres dos 30 e tantos, pois lhes parecem ter mais maduras de conteúdo e bagagem, portanto refreia seus impulsos.
Bem...e aí o homem alcança os 50, e o termômetro aponta para uma temperatura difícil de ser combatida, pois o capricho do destino lhe prega uma peça e o acaso faz a jovem habitar o seu cotidiano, admitida que foi pelo RH de sua empresa. Ao vê-la, surpreso, constata que ela está esplendorosa aos 25. E é esse o instante imprevisível, pois na angustiante ansiedade diária de pousar seus olhos na garota o fazem supor apaixonado. Há o flerte, o encantamento, e ela tão jovem, atraente, ele, boa pinta, sedutor. E há todo um tsunami de sensações, e essas ondas tragam a vida de ambos, e ele abandona os filhos e uma esposa balzaquiana lapidada por dietas e cirurgiões. Talvez nesse novo relacionamento haja amor, paixão, talvez não haja nada, apenas acomodação de interesses, egos. O dele se prostrando à juventude, e ela à experiência e refinamento daquele sujeito grisalho e de bom gosto. É óbvio que as esposas, mesmo que mantenham a ótima aparência jamais concorrerão com a exuberância dos 25. É óbvio também que não estou afirmando que esta é a regra. Não! Não é. Há e haverá exceções e serão vividos ótimos e duradouros relacionamentos mesmo com a visível diferença entre suas faixas etárias.
Porém como exclusões também não se constituem regras, o mais comum são os relatos dos casos dramáticos e que seguem a previsibilidade. Sendo assim vamos em frente com o caso, pois agora ele se vê refém daquela garota que o faz sentir tão jovem. Para ele nesse instante tanto faz ou faria se ela estivesse 18, 19, 20, pois seria nada mais que mero detalhe. E ele mergulha sem máscara no jogo da sedução, dos galanteios e das ofertas de presentes, (muitos, caros) E ele se sai bem, pois a experiência está a seu favor. Porém existirão coisas que não foram pesadas numa balança de precisão, pois repentinamente a juventude passa a aflorar nele o ciúmes, a possessão, há algo doentio e inesperadamente já não há a certeza de que aquele corpo escultural seja somente dele. Enfim, e para o azar daquilo que já não está bom, nada mudará o fato de que ele está com alguém 25 anos mais jovem. E é neste ponto que desanda a maionese e o relacionamento passa ser um forte candidato ao naufrágio. E se naufragarem, para ela a vida será apenas a continuação, possivelmente o desemprego a a procure gente de sua idade, do seu meio, afinal, os mais velhos lhe parecem complexos e desinteressantes. Para ele talvez os fatos sejam mais cruéis e rudes, pois poucas pessoas estarão dispostas a perdoá-lo, mesmo que afirme que andou com a cabeça nas nuvens. Todavia se acostumou à juventude, portanto haverá o consolo da ciência e seu avanço, uma mãozinha extra de drogas que permitam que usufrua uma virilidade quase milagrosa, evitando assim que sucumba à humilhação total...
-Psiiiu! Você ouviu o que falei? Você se imaginaria tendo um caso com uma garota de 25 anos? Já parou para pensar o que isso poderia representar? – Ela questiona raptando-me dos pensamentos. Os olhos agora não parecem tão duros.
-Não dona, não parei pensar não. Deve ser muito complicado – Devolvo laconicamente. Algo me dizia que a exposição do meu ponto de vista talvez não fosse do seu agrado.
Enfim, quem poderia me afirmar se o caso inverso não fosse o dela? E se assim fosse quem ficou abandonado no apartamento de quatro quartos e três suítes foi o marido cinquentão, grisalho e executivo. Não é de duvidar que à reboque haja um filho de 17 vestido numa negra camiseta do Ozzy Osborne. Portanto sem a certeza de nada procuro evitar juízo de razão.
-Pois é! Homens nunca pensam em nada! Só querem aproveitar – A voz quase esganiça num soluço breve. Era notório que existia o sofrimento.
Entretanto nada poderia fazer, pois é o tipo da dor que se combate como um único antibiótico, e esse medicamento miraculoso é o tempo, é o deixar passar, é o dia após o outro. E também ficar olhando para ela com cara de idiota não resolveria a questão.
-Dona, posso me sentar à mesa? – Pergunto, já que a companhia parecia a melhor opção. Ela olha surpresa.
-Por acaso o senhor tem 25? – Eu sinto o sabor do deboche.
-Não – Devolvi já dando as costas à caminho de minha mesa
-Bem...então pode! – Ela exclama se vestindo duma gargalhada que, notei, esforçada. Penso sobre aquilo e concluo que além de louca é esperta.
Com gestos comedidos puxo a outra cadeira e me acomodo enquanto ela, sentada, volta o corpo e suspende a alça da bolsa que se dependura no encosto da cadeira. Já com ela em mãos revira o interior e procura sabe-se lá o que, afinal a bolsa de uma mulher tem a capacidade de guardar o universo. Segundos depois e objetos retirados ela repousa na mesa a carteira de cigarros, o isqueiro e um celular de tamanho considerável. Em seguida acende um e liga o aparelho tocando em alguns dos seus comandos e concentra-se na espera de algo. Inesperadamente o seu sorriso, e ela me oferta o celular e eu o pego com a mão direita enquanto que, com o dedo indicador da outra mão tento centralizar os óculos no nariz. Olho para a tela e a imagem é de ótima resolução. Sim, claro, sorrio, pois aquilo nada mais é que coisa de burguês, não a foto, obviamente, mas o Iphone de última geração.
-É ele! André! 21 anos! – Olho outra vez e cravo a imagem e vejo um rapaz bonito e de sorriso atraente, desses que parecem dizer: Hey, ta tudo bem! Sempre estará tudo bem!. Procuro mais detalhes na imagem alguns deles me remetem à infância, talvez o seu par de covinhas nos cantos da boca, não sei... Penso em fazer algum comentário elogioso, porém acredito que o instante seja inapropriado.
-É por causa desse maldito que estou desse jeito! – Ela mastiga as palavras ao acender outro cigarro. Eu a olho perplexo, pois deixou de ser comum pessoas acendendo cigarros em shoppings, bares e afins. Ela percebe a minha surpresa.
-Ih, não vá me dizer que é mais um desses castradores dos fumantes...Se for..foda-se! – Ela sentencia para meu desapontamento. Definitivamente a retiro da lista dos espertamente loucos e a coloco numa nova divisão, algo mais ou menos como a dos porra-loucas.
-Não, não dona! Também sou fumante...é que a legislação municipal estabelece que... –Ela não me deixa terminar
-Danem-se as imposições municipais, estaduais, federais. Danem-se as autarquias, os protestos e pretextos. Quero é que todos se explodam! – Ouço-a em silêncio procurando me isentar de qualquer expressão facial, afinal, não pretendia ser achincalhado por outras de suas observações.
Sem nada comentar levo meus olhos para a madeira da mesa e reparo nos pequenas crateras que ela alargou e também em seu copo e no pouco líquido que nele adormece. Tentando ser feminina se apodera do copo de forma delicada e dá uma longa tragada fazendo desaparecer a bebida trnsparente. Após estala os dedos.
-Hey Tony Blair, mais um duplo Absolut e meio copo de soda. Ah...não se esqueça do gelo, muito gelo! – Solicita como um estivador ao prestativo dono do bar.
Aproveito a ocasião e também peço mais uma dose da minha. Era evidente o nosso abismo social. Olho outra vez e agora ela está numa guerra com os comandos do celular, todavia sorri ao novamente achar o que procurava.
-Eis aqui um outro meu amor! – Ela diz passando-me de novo o celular. Olho para a tela e na foto a Sra Porra-Louca surge enroscada no pescoço de um rapazote de compleição atlética e aparência adulta, inclusive mais até que o garoto da foto anterior.
Uau! A mulher era simplesmente um “papa-anjos” a Messalina dos tempos cibernéticos– Tive que concluir pelo suposto tom de intimidade que a foto me sugeria
-Esse é Carlos, 18 anos, meu filho! – Ela sentencia agora numa tonalidade suave e onde não mais parece existir o olhar da loucura.
-Ah sim! Aquele com a camiseta do Ozzy? – Pergunto aliviado sem lembrar-me de que foram os meus pensamentos que assim vestiram um rapazote até então fictício.
-Ozzy? Cê tá louco cara? Por acaso você está falando do Ozzy Osborne, o vocalista do Sabbath?
-Sim, dele mesmo! – Confirmo. Obviamente não confessaria para ela que, apesar dos meus 50 e tantos eu era um fanático por rock progressivo, principalmente o dos anos 70, entre eles as bandas Deep Purple, Led Zeppelin e Black Sabbath, afinal, o que ela poderia pensar?
-Não meu amigo, não é bem isso não. Do rock e do Ozzy Osborne gosto eu! A praia do meu guri é outra, pois somos apostos no quesito musical. Deve ter ouvido falar em Daniel, Gean & Giovani, Zezé Di Camargo, e outros desaforos musicais... – Ela diz num tom inconformado derrubando os ombros em desânimo.
-Hahahahaha – Sim, foi a minha resposta, a primeira gargalhada em dias.
Depois das risadas pareceu criarmos alguns vínculos de cumplicidade, então conversamos bastante e rimos um bocado quando soube que eu também era chegado num bom e velho rock in roll. Riria também com um caso que lhe contaria em seguida, já que ao recordar as questões das fotos afirmei que não apenas nós, mas também os animais praticam aquilo que denomino como “síndrome dos fatores e imagens associadas”
-E com os animais, que fatores poderiam ser esses? – Quis saber, Seus olhos brilhavam mais curiosos que ébrios.
Mesmo depois de algumas doses o seu corpo se mantinha ereto, e ela tinha classe e bebia como poucas. Mais uma vez molhou a boca no copo e me surpreendia, pois não me mostrava os efeitos da bebida, e mesmo estando “tocada” praticava a nossa língua e de forma precisa, sem as palavras arrastadas ou o queixo caído dos bêbados. Aproveitando o tema "Síndrome dos fatores e das imagens associadas" mandei ver:
-Tá bom! Vou citar um caso sobre velhos amigos meus. Dylan e Janis – Comecei após um pequeno gole na bebida – Bem, é um casal de chipanzés abrigado no zoológico municipal. Aliás, sobre eles eu os conheço há uns 6 ou 7 anos... e esse nome fui eu quem os dei, já que acho muito chinfrim seus nomes oficiais, ou como são por lá conhecidos; Frederico e Margarida –
Nesse ponto da narrativa pauso, retiro um cigarro do maço que estava sobre a mesa, olho para o Finley, e ele como parece não se importar dou uma longa tragada até me arder o peito. Depois ergo a cabeça num ângulo perpendicular e, abrindo os lábios expilo rodas de fumaça. Ela parece se divertir vendo os pequenos círculos de fumaça levitando no espaço e tenta fazer o mesmo, porém engasga na primeira tentativa.
-Você está me enrolando assim como essas rodas de fumaça! Conta logo essa história, homem! - Ela sorriu demonstrando ainda o ranço da altivez. Bem, talvez fosse o seu jeito, nada mais que isso – Concluo. Então continuei;
-Bom... lembro que há muitos anos atrás estive por lá e me juntei aos visitantes para olhar os macacos, já que sempre é divertido notar suas reações. E o pessoal atirava amendoins, pipocas, balas e outras coisas, apesar do cartaz que pedia para não alimentarmos os animais. Bem, já era tarde e o zoo estava para findar as atividades e os visitantes começavam a se retirar e eu permaneci ali olhando pare eles. Repentinamente me deu uma vontade de voltar a ser a criança transgressora. assim, retirei alguns salgadinhos da embalagem vermelha do “Baconzitos” e atirei para o Dylan, já que seus colegas haviam se recolhidos mais ao fundo da jaula. Os petiscos atravessaram a tela de arame e foram parar próximos a ele que, sem titubear levou-os à boca...- Outra vez pauso a narrativa e ela me olha atenta. Aproveito o situação e trago, não o cigarro, mas outra parte da minha bebida.
-Anda! Conta, conta logo isso! – Ela solicitava, ansiosa e divertida, agora com os olhos negros mais reluzentes que nunca.
-Sim...Depois que Dylan comeu os salgadinhos, esmurrou o peito por quatro vezes e saiu em disparada para o final da jaula. Fiquei observando as suas reações e foi então que arrebatou Janis no meio dos colegas ou parentes e a trouxe até onde eu estava. Agora a coisa mais louca aconteceu - Outra vez fiz a pausa para lhe observar as reações. Não demorou:
-Anda, anda! Quer me matar de curiosidade? - Ela protestava
-Bem...foi então que ele praticou o sexo mais louco e selvagem que presenciei, e a Janis se empolgou, pois provavelmente jamais viu o parceiro naquelas condições. E o estranho é que depois disso visitava-os regularmente, ocasiões que lhes atirava pipocas, amendoins e outras bobagens, e não havia no Dylan ou na Janis qualquer reação, apenas comiam e me olhavam desinteressados. Entretanto, era verem a embalagem vermelha dos Baconzitos, aí, bem, aí tudo se transformava, e eles agiam frenéticos e gritavam sem parar ao chacoalharem a tela de com violência, insanos.
-Nossa...que história mais louca! – Hum...síndrome dos fatores e imagens associadas...interessante isso, muito interessante – Ela conclui sem me parecer convencida.
Depois disso bebericamos lentamente mais algumas doses e conversamos sobre outra infinidade de assuntos, ocasião em que relatou a sua má história da paixão nutrida pelo garoto da foto. Resumindo, eram quase duas da tarde quando ela resolveu ir embora. Nos despedimos com um aperto de mãos e olhares cúmplices, ocasião em que retira um cartãozinho da carteira. Antes porém rasga com a mão a parte superior. "Não precisamos de nomes" - Ela diz - Acho engraçado ela devolver para o interior da bolsa o pequeno pedaço extirpado. Olho para o cartão e nele consta o número do seu celular
-Isso é pra quando você quiser jogar um pouco de conversa fiada! - Disse e sorriu tímida. Depois rumou para o balcão. Vi quando conferiu as comandas apresentadas pelo Finley deixando sob o balcão um par de notas de 100.
-Psiu! Paguei suas bebidas! - Ela me comunicou de longe. Agradeço com aceno de mão e ela devolve o gesto.
Assim que saiu do estabelecimento me desloquei rapidamente aos retângulos de vidro da janela e a vejo entrar no estacionamento do outro lado da rua. Aguardo dois minutos e a flagro ao volante de uma Mercedes Benz, fato que confirmava que aquela mulher jamais seria para o meu bico. Logo à saída do estacionamento vira à direita e tento acompanhar o carro até onde os pequenos retângulos permitem. Seu cartão ainda está em minha mão e o roço em meus lábios e ali mesmo sinto a suavidade dum odor feminino, e não me surpreenderia, claro, se o perfume fosse francês. Penso nela e em sua presença no bar, bebendo desde horário tão cedo, e imagino que ela tenha dado ali ao caso, talvez pela necessidade de beber e esquecer o garoto e as poucas horas antes, talvez a derradeira madrugada passada num motel de lençóis alvos e espelho no teto. Abandono as conjecturas e retorno à realidade e guardo o cartão na carteira e dirijo-me para a mesa. Ali, mais uma vez retiro a carteira do bolso e sacando o cartão fico olhando-o com certa esperança, um cartão estranho, sem nomes, mas tão somente números de formas arredondadas e no tom róseo. Apesar da vontade, jamais liguei.
Num sábado, decorridos dois meses e meio ao encontro no bar o telefone dispara. Tudo bem, aguardava uma ligação do “Semanário News” um jornal de tiragem semanal que abrangia à parte oeste da cidade, já que se mostraram interessados em minhas crônicas. Sobre elas, talvez o interesse se deva a algum editor saudosista que conheceu as crônicas que escrevera com relativo sucesso para um semanário de outra região da cidade, isso há coisa de 10 anos. Bem, quanto à proposta, não que fosse uma boa bolada, não, não era, mas ajudaria nas despesas.
-Alô, pois não? – Atendo. Do outro lado a voz de uma mulher, e parece amistosa.
-Por favor, aí é da residência do Sr. Dru Cavani?
-Sim, ele mesmo – Confirmo.
-Olha Sr. Dru, está intimado à comparecer com sua Palio Weekend verde, placas AEP0353 à Av. Moema 578 apto 71 às 20 horas para acompanhar-me ainda hoje num show que os Rolling Stones darão em Sampa, precisamente no Credicard Hall. Não se preocupe com os ingressos. Tenho um par de camarotes!
-Como assim? – Estou incrédulo
-Sim, e por favor, anote o endereço e não se atrase, pois o show começará por volta das 22,30! Estarei à porta do edifício trajando calça jeans e uma camiseta branca. Os cabelos agora estão ruivos e levarão um leve arranjo floral.
Estou atônito. Em todo caso também tinha os meus truques, mesmo que por vezes blefasse.
-Tudo bem doutora Carolina Ferraz Albuquerque, passarei sem falta no horário determinado! À propósito, a tua Mercedes negra, 2014 está acamada? – Devolvo e largo-me numa boa gargalhada.
Ela também ri, e repentinamente tudo me parece bem, pois eu simplesmente falava com a procuradora geral do Estado de São Paulo, já que dias após o encontro no bar e ao acaso reconheço a sua imagem na reportagem de um grande jornal de São Paulo. Outra vez a sua voz anuncia algo, e o tom é amistoso, carinhoso até. Ela diz:
-Ah, estou me esquecendo que tenho um recado do Sr. Dylan e Madame Janis - Depois da breve pausa, continua - Você não sabe, mas, nesse intervalo andei visitando as celebridades, não só eu, mas também embalagens vermelhas de Baconzitos. Mas, vamos ao recado; Eles pediram pra que te dissesse que eu e você somos o casal mais bacana que eles conheceram. E também estão exigindo a nossa presença – Carolina concluiu divertida, enquanto para mim só restou outro riso e a saudade.
Antes que desligássemos conversamos mais um pouco, e foi quando soube que andou procurando alguns exemplares dos meus livros, porém não os encontrou nas livrarias, talvez até pelos mais de 25 ano foram publicados. No entanto a persistência recorreu aos sebos e num deles encontrou os dois volumes; “Entrevistando um grande escritor” e “Uma trepada num elevador de bairro judeu” os quais leu e disse ter impressionado. Não contente levou meus livros para uns amigos editores (dos grandes, segundo ela) e disse que eles também se entusiasmaram, e que em breve farão contato para agendarmos uma reunião. Enfim, ótimas notícias é que não faltaram e talvez ver os jurássicos Rolling Stones com os septuagenários Mick Jagger, Keith Richards e ainda pulsando rock não fosse a grande ou o mais importante acontecimento da noite. E sobre isso era bem provável que Dru Cavani e Carolina Albuquerque tivessem a mais absoluta certeza.
Em resumo, tinha que correr para não me atrasar, pois
daria um pulo na Galeria do Rock à procura duma bela estampa do Led Zeppelin
numa camiseta de tamanho GG, afinal a última vez que me colocara uma daquelas fora no início dos anos 80 quando vestia as de tamanho "M" e tinha os cabelos longos além de curtir o movimento. Prevenido passaria também nas “ Lojas Pernambucanas” pois a ocasião requeria uma “Zorba” boxer, negra. Claro, não que contasse que algo fosse ou
pudesse acontecer, mas a vida é suficientemente sábia e te alertar que,
se aqui está é para que possa manter-se atento e esperto, pois às vezes ela te levará à encruzilhadas, e lá poderá existir a guerra silenciosa entre a vida e a morte, portanto matar ou morrer será apenas uma questão de tua escolha, e eu precisava me manter mais vivo que nunca, antes e depois do tal concerto.
Antes de sair à procura da juventude perdida abro o
refrigerador e retiro a garrafa e me sirvo duma ótima vodca polonesa que ganhara de presente.
- A tua saúde, Dru! Eu digo para mim mesmo e sorrio.
Ao terminar o drinque passo pela sala faço um carinho na cabeça de Hemingway, o meu gato persa. Não que ele tenha sorrido de volta, isso não, mas o conheço o suficiente, e ele é meio mágico, adivinho, e às vezes acho que ele sabe sobre todas as coisas, principalmente o passado e futuro. Sim, eu e Hem somos grandes amigos, cúmplices até, sei o que pensa, como age, sei das suas manias e trapaças. Ele soergue a cabeça e gosta da carícia dos meus dedos entre seus pelos, depois olha bem em mim e mia, não uma, diversas vezes. Sei que que há espantos naqueles longos miados, e ele está ansioso, e eu posso compreender o que me diz - "Ah patrão, pelo jeito tu andou conhecendo uma das boas" -
Volto a sorrir, e antes que feche a porta da sala e ganhe o hall dos elevadores olho para o Hem e ele boceja, irônico, preguiçoso, previsível como sempre. Ainda pude ouvi-lo uma última vez antes de abrir a porta do elevador:
-Vai lá patrão, com calma! Mas dessa vez pague a conta, por favor!
-Vai lá patrão, com calma! Mas dessa vez pague a conta, por favor!
Copirraiti 16Jan2014