terça-feira, 18 de dezembro de 2007

O escritor safado, a atriz pornô e duas pérolas


-Papai, vieram e instalaram no quarto a nova Tv 42 de plasma. Dê uma olhadinha e veja que linda! Ah, também trouxeram o home theater e o modelo é bárbaro!

Essa é a Anna! Anna com dois “N” como ela gosta de frisar, e eu, evidente, o seu marido. Somos aquilo que podemos dizer; “novos ricos”. E por sermos “novos” significa que nossa grana não veio por herança, mas sim por um fulminante golpe de sorte. Foi há coisa de 25 anos, ao ser sorteado com um bilhete de loteria federal - deu a milhar inteira no primeiro prêmio. Até àquela altura eu era um simples “ “joão ninguém”, desempregado e louco por Anna. Ah sim! O seu nome não era tão peculiar e infinitamente menos sofisticado que o de Anna Rachel que o usa e do qual se orgulha nos dias de hoje. Naqueles tempos a conhecíamos por “Ana Ventania”. E eu, fã, me virava e arrumava uns trocados pra admirá-la num palco, onde fazia um número pra lá erótico, aliás, na verdade, um espetacular strip-tease. O local, conhecido como Teatro Aurora, era nada mais que uma espelunca onde nós os desvalidos e miseráveis íamos a fim de vermos algumas garotas se despirem e instigarem instintos animalescos que habitavam na maioria de nós. No seu show, eu era o primeiro a chegar e último a sair. Naqueles dias, se alguém quisesse me encontrar era só me procurar na primeira fileira do teatro que me acharia facilmente. Ana Ventania também dava índícios de gostar de mim, talvez porque eu fôsse o único entre aqueles imbecis que não me masturbava durante a sua apresentação. E isso, de alguma forma deveria surtir algum efeito como se entendesse na minha atitude, ou falta dela, alguma espécie de respeito pelo seu trabalho “artístico”.

Verdade seja dita; pra quem gostasse de estética, era impossível não cobiçar aquela deliciosa jovem de pernas grossas e de bunda arrebitada. Por outro lado, eu nunca fora suficientemente bonito e as feições rudes me acompanhavam por onde quer que eu fosse. Assim, ao meu entendimento, era esse o motivo de fazer Ana simpatizar comigo.


Lembro da primeira vez que me munido da coragem dos heróis a convidei para beber. Foi logo após um dos seus shows de sábado. Ana, além de ter o seu próprio número, ainda participava de outros onde fazia algumas “pontas”. Num deles, hilário, atuava como uma empregadinha que vivia trepando com o patrão, que sacana sempre lhe prometia aquilo que nunca cumpria; um aumento de salário. E eu achava aquilo engraçado e me divertia vendo os "atores” interpretarem os textos como se fossem profissionais de teatro. Uns, levavam a coisa mais a sério e com suas vozes impostadas em tons dramáticos faziam o possível para nos convencerem apesar do cript capenga, que em nada ajudava. Nessa cena, o interessante ficava por conta de Ana e do seu curtíssimo vestido de copeira, que deixava literalmente à mostra as suas curvas e a fenomenal bunda. No fim, simulando uma mega trepada numa cama de casal empurrada as pressas para o centro do palco e logo após o orgasmo, o patrão era acometido de fortes dores no peito e terminava por morrer enfartado. O curioso visão um tanto proletária que tínhamos sobre os hábitos dos ricos, já que a morte sempre os pegavam vestidos em “hobby de chambre”, mesmo após uma bela de uma trepada.

Bem, assim que o show terminou lá estava eu esperando a Ana. Ela surgiu, sorridente, gentil e simplesmente vestida. “Vamos?” perguntei-lhe. “Sim, claro!” confirmou – Nos demos os braços e saímos andando pela miserável Rua Aurora, lugar de todos os tipos de malandros. A partir daquele dia começamos a nos ver com regularidade e o nosso relacionamento, por muitas vezes, foi mantido às duras penas já que, eu dera de enciumar-me das suas cenas em palco. “ Ah, papai! assim vai dar não!” dizia, áspera e nervosa. Quando eu percebia o seu olho direito tremer, sabia que a coisa ficaria ruim, e aí eu dava uma maneirada, tentando ser o mais conciliador possível. “Tá bom amor! Mas, precisava arrebitar a bunda daquele jeito?”. “ Ah papai! Para com esse ciumes besta! É só o meu trabalho!” - ela se defendia - Como não queria levar a coisa adiante, eu aceitava as suas justificativas e não tocávamos mais no assunto.


Aquela situação perdurou até o dia do bilhete premiado. Ao conferir o resultado, lá estava : 87.793 –
Havia dado o veado e o número completo do do meu bilhete inteiro.
Eu estava rico! Naquela mesma noite saímos pra comemorar e entre juras de amor e promessas acabamos dormindo num bom hotel da Avenida Ipiranga. No dia seguinte lá estávamos, Ana e eu, pedindo a sua demissão que, de má vontade foi aceita pelo safado empresário. Bem, a partir daí passamos a viver juntos, e assim nos encontramos até nos dias de hoje. Ela, por ter vivido alguns anos nesse segmento erótico (ela odeia que falemos... pornográfico) acabou por constituir uma produtora, cujo objetivo era o de criar bons filmes eróticos. Modéstia à parte, Anna se deu bem pois sempre foi eficiente naquilo que se propôs, e a sua produtora é uma das mais concorridas nesse segmento, sendo que a maioria dos melhores títulos pornôs, que inundam as bancas de revistas, levam a sua grife. Por meu lado, sem profissão definida, encarei uma vida de escritor, sem sucesso nenhum, díga-se de passagem. Mas, mesmo assim, vez por outra surgem lá em casa, jovens - geralmente universitários - sedentos por saberem quem é, e como vive o verdadeiro Érico Zambini, meu pseudônimo literário. As vezes trazem bebidas e em outras alguns dos meus livros para serem autografados. Acho-os engraçados e alguns, talvez decepcionados com o Zambini que vêem, me alfinetam: “Hey Érico, é verdade que tu casou com uma puta?”. E dito isso passam a me olhar com aqueles seus rostos idiotas à espera das minhas reações, que surgem a seguir: “Com uma puta, casou o corno do seu pai!” - costumo responder, colocando ambos os braços à frente, como se fosse um daqueles lutadores profissionais e fracassado. Diante da postura, desistem e se vão com seus risinhos imbecis adornando suas espinhas purulentas. Vez ou outra, a Anna ao me flagrar de conversa mole com alguma daquelas amalucadas garotas, logo dava um jeito de se livrar delas e as punha pra correr com uma das suas habituais tacadas :
“Ah, minha filha! Isso aí é galo velho. Cantar, até que canta, mas é somente um galho velho e cheio de pose! ” Dizia sorridente enquanto me piscava, mas sem que a guria percebesse. Geralmente, oor detrás da garota eu retribuia o sorriso. A guria acabando por achar que eu nao estava com aquela bola toda, sorria palidamente e se ia embora.

Fora essas questões, temos duas filhas, todas Anna com os dois "N", iguais à mãe. Uma delas, cujos os 18 anos serão completados nesse ano, já têem os preparativos para sua festa em franca providência. Anna Helena é o seu nome. Helena é uma garota linda, e não porque seja minha filha, mas, é um dos rostos mais belos que já vi. Talvez me perguntem: como alguém tão feio pôde produzir algo tão belo?
Eu lhes respondo com outra questão: Deus também não escreve certo por linhas tortas? Então!

Ah sim! Antes que me chamem de "baba ovos", confesso que ela carrega a parte defeituosa do meu "gen" no nariz levemente curvo, mas que na minha opinião ameniza a sutileza quase aristocrástica ds linhas do seu rosto. Mas ela, como toda garota rica e vaidosa nunca está e jamais estará satisfeita com aquilo que se tornou, e sempre procurará consertar as imperfeições que imagina ter, alterando algumas coisas em si. Tanto que, não satisfeita com a originalidade do dia que foi concebida, está reduzindo num caríssimo cirurgião plástico alguns centímetros em sua zona lombar, como não reconhecesse a originalidade, muito menos os esforços insanos dos espermatozóides do papai, naquela noite de uma corrida maluca. Além disso, a inexperiência a faz imaginar-se a dona do mundo, como a maioria das garota nessa faixa de idade. Além desses "pequenos" defeitos, elegeu o maior dos que possa ter; Fredy, seu namorado.

Fredy é um garoto duns 23 ou 24 anos, um gênio cibernético, disputado à preço de ouro pelas multi-multicionacionais que garimpam pessoas super dotadas em nosso país. E essa batalha feroz, faz com que sempre tenha ofertas milionárias para sossegar o rabo numa dessas empresas. Apesar disso, acho estranho a sua aparência. Se o olharmos bem, veremos nele um protótipo quase parecido com Bill Gates;rosto magro, nariz agudo e uma míopia excessiva, vestida de imensos e profundos óculos quadrados. Mas, isso é fichinha diante meu estranhamento diante o fato de vê-lo constantemente dormindo Acho mais estranho ainda o fato de ele estar dormindo em casa e com a nossa filha. Anna Rachel me convenceu com o argumento que é melhor estarem protegidos dentro de nossa casa, ao vagaraem por aí, em algum lugar, e com a vida à mercê de bandidos de toda a sorte, principalmente desses que infestam as grandes capitais. Olho para a Fredy e sinto pena da vida que ele e a Anna Helena poderão levar. Sei que irão se casar pois ele é do tipo de babaca que se encanta com a primeira garota que faz sexo com ele. Certamente foi ela.

Anna Helena sempre me fascinou pela sua independência e liberdade sexual. Acho hipócritas aqueles pais cheios de "não-me-toques" com os filhos. Evidente, quando saem de casa deixam de ficar sob nossa supervisão, e o mundo abre-lhe as portas para as coisas mais bacanas e safadas que se possam imaginar. E isso me faz ter longas conversas com ela e dar-lhe alguns toques que imagino necessários. Não sei se foram esses toques, mas, Helena me parece tranquila e apaixonada por ele. Sei que se casarão e terão 5 filhos. Sei também que todos os anos sairão em férias para Barcelona ou Paris. Sei também que ele dará um jeito e abreviará a viagem com o argumento de ser imprescindível o seu retorno, face a um mirabolante contrato que fará a sua empresa abocanhar a maior fatia no mercado nacional de software, gerando portanto, alguns milhões de dólares a mais. Talvez, se assim acontecer, Anna arrumara um amante, um desses caras bom de cama e o que poderá ocasionar uma reviravolta fascinante nessa estória do Fredy nunca poder estar com ela e as crianças.
Mas, mesmo acometido desses pressentimentos, não me sinto vontade de falar com ela sobre o assunto; - Cê tá ficando louco, pai? - Sei que vai responder. Então é melhor deixar as coisas como estão, sem me preocupar demasiadamente com o magnata dos sofwares.



Ah, agora aobre a minha paixão; Anna Isabel. Essa é a minha princesinha, Nesse mes completará 8 anos e é esperta como ela só! No começo do ano, Rachel cismou que os conhecimentos da pequena estavam aquém do ideal, conclusão; colocou um anúncio à procura de uma babá. Nele especificou que a canditada fosse ávida leitora de literatura infantil e que soubesse de todas as estórias de Monteiro Lobato. Segundo Rachel, uma pessoa que conheça todas essas estórias, está capacitada a ensinar algo de produtivo. Achei interessante o ponto de vista de Rachel, e suspirei aliviado pelo fato da contratação não depender dos meus conceitos, já que encontraria nos leitores de Fante, Bukowski, ou Céline, alguém talhado pra transmitir algumas verdades da vida, mesmo que amargas.

No dia marcado para entrevista eu não me intrometi e só fiquei sentado olhando atentamente para a candidata. Chamava-se Francine, e percebí o quanto ela impressionou a Rachel.
Fran, como passamos chamá-la, era uma bela garota dos seus 24 ou 25 anos. Tinha pernas estupendas, ótima bunda e um ar superior, daqueles que se acham grande coisa só porque sabem um pouco das estórias de Lobato, e de alguns outros monstros sagrados da literatua mundial. Claro, fiquei apreensivo e impressionado já que no fim da reunião parecia ser ela a entrevistadora, como se fôssemos nós que deveríamos nos provar dígnos e à sua altura.
Anna Rachel, toda impressionada com a garota, respondendia as suas perguntas como se estivesse fazendo um "exame de ordem" -" 0 que fazem? São formados? Essa casa é de vocês? - e mais algumas que não lembro. Teve um momento que tive vontade de dar um basta naquilo, mas, sabendo que nessas questões domiciliares quem decide tudo é a mulher, achei melhor deixar pra lá. Entrevista terminada, Francine foi contratada para ser a babá de Anna Isabel. Anninha, a princípio foi com a fachada de Fran e me pareceu se darem bem, cumplices que eram em olhares e sorrisinhos. Eu ainda me mantinha desconfiado e achava que alguma coisa poderia estar fora de lugar. Essa impressão logo se confirmou:

-Papai, é verdade que Sartre e a uma Simone num sei de que, eram casados mas não dormiam na mesma cama? - ou -

-Papai, o senhor nao achou uma violência que fizeram com o amor de Romeu e Julieta?

-Papai, o que Shakespeare quis dizer com " Ser ou não ser..eis a questão!"

-Ah papai, o senhor gosta das poesias de Baudelaire?



Puta que pariu! Aquilo já era demais. A babá, ao contrario de tentar contar estórias infantis pra menina, como seria de se esperar, preferia encher a cabeça da Anninha com baboseiras que nao lhe serviam pra nada naquele momento. Sem consultar a Rachel, despedí-a. Claro, Rachel gostava da garota e então pediu para darmos nova chance a ela. Tudo bem - concordei - porém a deixamos a par que não mais permitiríamos novos absurdos. Como ela já havia se afeiçoado a Anna Isabel, concordou plenamente e por uns 15 dias lá estava a pequena a me questionar coisas que eram compatíveis com a sua idade e que saudavelmente deveriam ser do seu conhecimento:
-Papai, quanto media o nariz do Pinóquio?

-Papai, é verdade que eram louras as tranças de Rapunzel?

Finalmente tudo voltava à normalidade e estávamos todos plenamente satisfeitos.Isso durou um mês até querm certo dia:

-Papai, o senhor não acha que Getúlio Vargas cometeu uma atitude covarde tirando a própria vida?

Aquilo foi demais para minha paciência, e, sem falar ou querer saber a opinião Rachel, dispensei-a no mesmo dia. Juntos foram algumas lágrimas, suas belas pernas e o rabo fantástico. Talvez o que a garota nao tenha percebido é que a Anna Isabel ainda se depararia com situações emergenciais e cruciais na sua caminhada de vida. Que haveria para nossa garotinha, num futuro não muito distante, amores e amizades que lhe fariam doer. Haveriam desilusões, falsidades, mentiras, vindas de gente que ela jamais poderia supor. Haveria o relacionamen comigo, com sua mãe, sua irmã e todas suas dúvidas se estaríamos sempre presentes ou se negaríamos o apoio caso pedisse socorro. Essas questões afligiriam a nós e a nossa pequena numa estrada logo adiante. Porisso, achei que a insistência da babá em transformar a nossa criança num adulto prematuro, descabido e imprópria. Todos devemos permanecer atentos. Crianças estão para brincarem, as putas para se prostituirem e os adultos para fazer o que lhes der na telha, desde que respondam por seus atos. É assim que deve ser, é assim que se forma o ser, num progresso lento mas constante. Trilhando nestes caminhos se forjam sentimentos, relacionamentos, bandidos e mocinhos. E mais ainda; a vida não é exatamente uma dádiva, é um árduo exercício.


Francine, partindo, esquecemos por completo aquela coisa de "suplemento educacional" e deixamos Anna Isabel voltar a ser feliz com seus patinhos e a 3a série do primeiro grau.
Esses somos nós; apenas uma família. Somos a executiva Anna Rachel e sua produtora de filmes éróticos. Somos suas atrizes de seios siliconados, somos seus atores - garotos funcionados a base de sildenafil -. Somos eu e meus livros de contos sujos e por vezes engraçados.
Somos, acima de tudo, nossas crianças; Helena, linda, charmosa, apaixonada por um babaca, um futuro Midas da informática, que fará fortuna eu sei, mas que torço para que o dinheiro não o cegue por completo e o faça destruir valores reais que a vida nem sempre nos propõe.
E por fim, somos a nossa garotinha, Anna Isabel, meu xodó, linda, de um sorriso infindo e dum olhar quase tão divino que até o Papa se enciumaria.
Essa é a minha princesinha de braços amáveis que envoltam o meu pescoço, e que nada me faça separar.

Racionalmente, por enquanto estão fora das nossas atividades, longe dos meus livros de sacanagem e da safada nudez dos filmes eróticos. Sempre haverá espaço para outros estilos de vida e, o que elas precisam saber de momento é que a vida é um dom, um exercício e que é preciso saber vivê-la da melhor forma possível.
Por hora várias auras de felicidade contornam nossos corpos e mentes. Será sempre assim? Apesar de torcermos, nunca teremos a absoluta certeza.