domingo, 20 de junho de 2010

A vigarice e o efeito dominó

Eu estava cercado de vigaristas.
Parecia que minha vida toda fora forjada para dar guarida a esse tipo marginal que gruda na gente feito sanguessugas iguais a esses que trapaceiam em esquinas com formas de empadinhas e bolinhas por debaixo delas. "Cambada de patifes vagabundos!" - Vociferei aos quatro ventos ao entrar pelo portão. Assim que atravessei a porta da sala fui interpelado por Matilde, minha empregada de talvez uns 45 ou 46 anos, mas que ainda dava uma bela meia sola. Ela estava comigo há quase dois anos e viera  indicada por um seu parente dela, meu cliente, vinda do seu Rio Grande do Sul após o falecimento do marido num lugarejo à leste do estado. E eu adorava aquele seu linguajar sulino, cantado, quase que exclusivamente voltado à segunda pessoa verbal, singular, plural, mesmo que por vezes confundisse. Porém logo notávamos que Matilde tinha no mínino o curso ginasial completo além de uma memória fantástica.

- Senhor China, na tua ausência um senhor esteve te procurando.

-Foi mesmo? E o que ele queria Matilde?

-Bah! Era um sujeito aporreado e antes que eu perguntasse qualquer coisa foi logo se apresentando: Moça sou oficial de justiça!

-É? E você, o que respondeu?

-Ora, patrão! Eu disse apenas que era a serviçal da casa e que estavas ausente.

-Poxa! E ele?

-Barbaridade senhor China! O homem parecia um bagual e respondeu-me assim: (Matilde pegou o jornal que estava em cima da cômoda e o gesticulou no ar como se esbofeteando o espaço)
“Minha senhora, diga a esse senhor, a essa pústula, que ando com o saco escrotal inchado de tanto correr atrás de larápios tais quais a ele” -  Ao terminar, Matilde ainda mantinha o punho cerrado no vento. Tive vontade de rir, porém s seriedade do momento dizia não ser a melhor hora.

-Ô merda! – Resmunguei sugerindo aflição. Afinal, a verdade do fato e que me deixava furioso além dos eruditos de plantão era oficial de justiça metido a literato.

-Ah, senhor China, o azucrinado também deixou isso aqui  – Concluiu ao me entregar um cartãozinho de visita.

Olhei para as  letras douradas na negritude do pequeno cartão, e ali em garranchos góticos, li - Ruy Machado Alves Barbosa de Castro –  Abaixo do seu nome  o termo "Oficial de Justiça"  se gravava numa tonalidade mais forte.
Reparei também que ao lado esquerdo do cartãozinho constava o número do telefone fixo e celular, o que me fez rir, pois relendo-o  observei que o indivíduo não portava apenas a funcionalidade da sua arrogância, mas também o compêndio dos sobrenomes das mais cultas cabeças da literatura nacional.

-Bem, e se o guapo  voltar e não estiveres, que digo ao apotrado, senhor China? – Ela questionou enquanto o meu olhar divertido abandonava o reluzente cartão plastificado.

- Ara Matilde! Diga simplesmente o seguinte para o almofadinha babaca: O senhor China mandou dizer apenas que: Piperácea no ânus de outrem é líquido insípido gaseificado

Os olhos de Matilde se arregalaram – Capaz! Que diabos pretendeste dizer com isso, senhor China? – Ela pergunta perplexa. Talvez eu exagerasse na dose

-Ah! Nada não, Matilde! Esquece!


Copirraiti 2009Mar
Veio China ©



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