sexta-feira, 27 de julho de 2007

Contos e Crônicas postados no Bar do Escritor part.I


INTROSPECÇÃO

Talves a natureza aguarde algum momento propício. Talvez, aguarde que o amor esmoreça, que a lágrima não role e que os sentimentos nos abandonem.
Talvez ainda veja em nós algo de amor e alguma solidariedade nas sensíveis lágrimas roladas nas faces dos emotivos. E quando esse dia chegar o sol e a lua se aperceberão. Ele, a sorrir um riso triste, morno, inerte, quase que sem vida. Ela, nostálgica, melancolicamente refletida como a lágrima de mulher.
E, se assim for, talvez ao se encontrarem, sol e lua resultem em fenômenos, sei lá, daqueles que torne insano o mercúrio dos termômetros ou, que derreta em segundos todo o gelo dos aceanos glaciais. Talvez, permanecemos aqui porque os sentimentos ainda não se foram por completos e, as lágrimas, por hora, ainda descem em faces emocionadas. Talvez, e só por isso, que ela, a natureza ainda nos dê um pouco mais de tempo.
E, talvez, quando nada mais houver pra ser vivido, quando de nós tudo houver partido, eles, sol e lua se unirão num mútuo e doloroso abraço e, ali, no riso o triste e de escárnio, no ato irônico e lamentável irão nos proporcionar o fim. E então nada mais haverá que possamos fazer e, nem mesmo nos será permitido agraciar a grandeza desse momento. Ele será magnífico, devassador, eclodido na mais deslumbrante pororoca sideral.





A FOTOGRAFIA

Sempre o mesmo cenário. Noite chuvosa, raios e trovoadas.
Num cômodo de cortiço, ele bebia. A feição sombria e o olhar de gelo não deixavam transparecer qualquer emoção naquele sujeito. Talvez fosse o seu olhar mais gelado que a estúpida cerveja que emborcava. Fitava fotografias de mulheres, fixadas atrás da única porta. Curiosamente, todas as fotos eram de mulheres grávidas. Eram sete fotografias, todas presas por taxinhas. Das sete, cinco estavam assinaladas com um imenso "X". Ele detinha-se na sexta e achava bonita aquela garota loira, talvez 25 ou 26 anos, o seu serviço de logo mais. Retirou-a meticulosamente da porta, e com o necessário cuidado para não lhe rasgar o papel. Com o dedo indicador contornou sutilmente o rosto de um sorriso meigo e acariciou os cabelos aloirados para em seguida fixá-la no mesmo lugar.
Tinha que certificar-se que que não haveria a menor condição de algo dar errado. Pousou os olhos na mesinha de cabeceira e lá, acima do tampo repousava uma kodac, dessas baratas, descartáveis. Desprezou-a, já que não precisaria dela por hora.
Ao seu lado se encontrava a navalha, essa sim, necessária. Foi até lá, pegou-a e colocou a lâmina no bolso dianteiro da calça. Caminhou até a cadeira e do encosto retirou a jaqueta e, antes que saísse fixou-se na sétima foto. Ela se dispunha um pouco distante das outras. A princípio olhou-a com indiferença. Os segundos, nervosamente passaram e então a surpresa; Do rosto gélido rolou a lágrima.
Foi única. Uma lágrima de dor, de dilaceração. Pegou-se piegas ao estar chorando, ali, diante de um pedaço de papel. Sim, papel e não foto. Nele, não havia qualquer fotografia e, apenas algumas letras mal grafadas e com a falta do til, onde se lia; MAMAE. Vestiu a jaqueta e saiu. Julgava ser mais um serviço necessário e que por ele deveria ser feito. Nunca existiu uma mãe pra si, então, justo não era que houvesse para outros. Estar vivo, pra ele, nada representava.
E, na posse da plena loucura se lamentou de não ter tido pra si, um igual a ele.


3054. O VÔO DA MORTE

3054; três, zero, cinco, quatro.
Não, não foi o prêmio de milhar.
Foi o número de um vôo, da Tam. Foi mais um descaso dos que acham que não há a obrigatoriedade de vidas a se manter. Pra que? Besteira! São seres humanos Dá nojo do descaso com o qual somos tratados. Afinal, que nós somos além de seres humanos? Foram 186 de vidas assassinadas. Vidas ceifadas pelas irresponsabilidades das autoridades competentes. Competentes? Isso sim é uma piada! Talvez o mais triste não é o saber que se morreu (se é que há como saber)
E às vezes morremos por nossa conta e riscos. Morremos pelo desgaste dos nossos corpos ou dos muitos anos. É obvio. E, se aqui estamos, sabemos aqui é para morrer. Então, o problema não é esse. O infame, nesse caso, foi ter partido sem saber, sem ter ao menos a chance e de se bater o dedo no sinto de segurança. Se foi a pista, a drenagem, a imperícia, o comando aéreo ou outro qualquer órgão que e tenha um mínimo de responsabilidade, foda-se! Gostaríamos de saber, se é que aparecerá o responsável (nunca o governo exerce qualquer culpa). No fim, e após uns bons anos de desgaste, fazem um acordo indenizatório e fica “tudo como dantes no quartel de Abranches” Isso é muito triste e injusto. Eu só sei que se foram quase duzentas vidas. Bobagem! O que eram eles?
Sómente seres humanos. Pra que se preocupar?
Sei lá, porra!

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