terça-feira, 23 de novembro de 2010

A morte pede carona na ABL

Sabiam que peixes se constituem animais perigosos?
Sim! Saborosos, mas de alta periculosidade!
Entre eles posso citar o mais terrível: O “We are Champion”

O que muitos não sabem sobre o “We Are Champion” é que é um peixe de água doce e se origina no Rio Tamisa, na Inglaterra, berçário de sua espécie. E o fato nos passou despercebido até que foi trazido ao Brasil da era colonial pelos fidalgos ingleses, assíduos freqüentadores dos salões de Buckingham. Também não devem saber que esse peixe fornece uma carne compacta e de sabor inigualável. Contudo, apesar de tantos predicados o We are Champion veio junto com alguns dissabores, tornando-se algoz de muitos de nossa corte ante o despreparo de nossos "chefs" no processo do estripamento e preparo do peixe, e o que permitia que, camuflados, seus perigosos espinhos fossem à frigideira.

Conta a história que numa noite chuvosa da década de 20, na Academia Brasileira de Letras, o We Are Champion foi servido num jantar de gala. Milionário e sabedor dos segredos gastronômicos contidos aos redores do mundo, sigilosamente um dos imortais reproduziu a espécie em cativeiro e quis surpreender seus pares com um fausto jantar onde pudessem conhecer a inimaginável iguaria.

E assim foi; Numa mesa imponente O “We are Champion” foi consumido com avidez. Atônitos, os mortais procuravam entender o milagre daquilo. Todavia não contava o Barão de Tiririca, patrocinador do deguste e titular da cadeira número 5, que fosse sufocar ao ter um enorme espinho cravado à garganta. O desespero do barão tornou-se evidente para o seu companheiro de mesa.

-O que foi Barão? – Assustado perguntou-lhe Adamastor Freijó – titular da cadeira de número 29, apreensivo ao vê-lo esganiçar tal qual cachorro engasgado.

-We Are Champion! – Respondia o velho Barão, massageando a garganta com insistência.

-Sim Barão! Eu sei que o senhor é um vencedor, mas... – Retrucava Adamastor sem entender perfeitamente aquela estória de "We are Champion”

We Are Champion! We Are Champion! – Aflito insistia o Barão.

Evidente, o esforço vocal fazia o espinho deslocar-se e aprofundar-se na faringe do imortal. E, em se aprofundando o Barão passou a ter problemas para respirar – O ar parecia fugir dos seus pulmões –

-We Are Champion! We Are Champion! – Ele repetia ante a perplexidade Adamastor que estapeava as suas costas, mas sem que surtisse efeito.

-We Are Champi... We A…Cham… – O Barão murmurava. A sua voz agora rouca perdia a força como a de alguém em estado terminal.

Sem o ar para ventilar os pulmões o rosto do barão ganhou uma tonalidade arroxeada, acompanhado das pupilas dilatadas e pernas tremulantes. Não tardou para que desabasse como um prédio implodido. Surpreso, Adamastor gritou por socorro. Diante da gravidade do fato instalou-se um corre-corre, telefonemas e pedidos de ambulância. Porém, quando chegaram se fazia tarde; O Barão de Tiririca falecera, desencarnara. Após muito fuzuê, policiais, imprensa, curiosos, o corpo do homem foi retirado. Academia evacuada, os imortais aglomeraram-se no salão nobre para discutirem entre si o que se fazer numa situação daquela.

-Adamastor, como isso pôde acontecer? – Questionavam-no perplexos.

-Não sei ao certo, digníssimos colegas – Respondeu o imortal, desolado – Eu só sei que ele perseverava: We Are Champion! We Are Champion! E assim foi até arroxear-se e lhe faltar o ar vital - Respondeu desconsertado.

-Oh! Pelo grande Machado de Assis! – Exclamou um deles – Estúpida tragédia! – Retrucou o outro.

-Estúpida coisa nenhuma! Esse filho de uma puta mereceu! – Excitado berrou o quase centenário Afrânio Coutinho, titular da cadeira de número dois – Esse miserável não teve humildade nem pra morrer!

E o imortal Afrânio Coutinho, como se mergulhado num processo de perturbação persistiu na ladainha, duas, três, quatro, dez, vinte, trinta, cem vezes e até sua voz definhar. Ele estrebuchava e continuava fora de controle e nada nesse mundo e nem os protestos dos seus pares o fizeram calar. Aliás, algo fez sim; um fulminante enfarto do miocárdio.

E assim, melancolicamente, dois funerais foram agendados para a manhã do dia seguinte abortando uma pendência de mais de 40 anos entre os antagonismos literários e batalhas de egos.
Dizem as más línguas que a partir daquela desgraça os imortais jamais foram os mesmos. Dizem até que em comum acordo determinaram a proibição de almoços e jantares nas dependências da Academia.
Contudo e em respeito à fleuma britânica e, principalmente ao inesquecível "We Are Champion" mantiveram e realçaram um fato light e que se tornaria a marca registrada da casa; Precisamente, o chá com torradas, das cinco em ponto.



Copirraiti 2010Nov
Véio China©

Um comentário:

Ozeias disse...

Curti pra caramba, meu Véio!
Junim