Ele estava sozinho.
Pra dizer a verdade não só ele, ele e o paredão. Havia também algumas pessoas nas arquibancadas e elas pareciam torcer por aquele que seria trucidado. Todavia nada poderiam fazer, afinal eles eram apenas o povo, a parte fraca do negócio, ainda mais que diante do poder constituído e dum ditado que os ameaçava num jargão autoritário “"justiça é uma percepção dos donos do poder” Porém disposto ou não ao autoritarismo a sua hora parecia ser chegada
-Apontar! – Ouviu-se o brado duma voz militar. Ele não se recorda se era a tonalidade da voz de um primeiro tenente ou do segundo sargento, pouco importava naquele momento, apenas sabia que era tonalidade militar
O fuzil apontava para o seu corpo enquanto ele se questionava sobre o primeiro tiro. Poderia parecer engraçado, mas, torcia que fosse alvejado no coração. Talvez até a misericórdia viesse num tiro contra a sua cabeça, porém anonimamente suplicava para que maldito soldado não objetivasse os seus miolos, sinônimo para ele de irrestrita liberdade.
Antes que a ordem de “atirar” fosse definitiva e assassina alguém se interpôs entre o condenado e a mira do soldado
-Senhor, pare! – Ordenou o recém chegado: Trago ordem do imperador Giovannius "The Great Head of Pudding" para que a execução seja adiada até que o condenado tenha a ciência do pedido de clemência. Portanto caberá a ele decidir a sua sina – Concluiu o forasteiro num terno azul e gravata vermelha
-Pois bem. E que clemência seria essa? - Perguntou o militar responsável pela execução ao pedir a documento comprobatório.
-Bom, o chefe da nação quer que o acusado, de viva voz peça desculpas públicas por ter se insurgido contra o sistema e sua autoridade na publicação do decreto do ato institucional número cinco cinco, mais conhecido como AI 55.
O acusado ouviu a tudo. Seus olhos estavam vendados, mas não o seu conceito da liberdade. Era chegado o momento de se pronunciar, sua vida dependia mais de si que da apontaria do soldado, inclusive porque não se valesse do “ato de clemência” só sairia dali com o sangue encharcando as suas roupas civis.
-E então, prestou atenção às instruções do mandatário? O que têm a dizer? – Perguntou o forasteiro ao acusado
-É sobre o AI 55? Aquele que fala da cassação do direito de expressão? – Perguntou acusado.
-Sim, não preciso repetir, e você sabe – Confirmou sujeito ao ajeitar a gravata bordô no colarinho da camisa
Ah... - Reticente balbuciou o condenado. Ele parecia pensar
Pouco após e diante do absoluto silêncio se manifestou:
- Pedir desculpa pelo autoritarismo do chefe da nação? Ora! Diga a esse ditadorzinho de meia pataca que foi ele o julgado. E mais; que injete em um dos seus orifícios as leis, afinal, ele ainda não se deu conta, mas, ele já foi assassinado por elas.
-Só isso o que têm a dizer? – Perguntou o sujeito do gabinete.
-Só! – Respondeu secamente.
-Apontar! –
Depois disso apenas o tiro e um corpo tombado ao chão. A cabeça permanecia intacta, nos lábios um evidente e indisfarçável sorriso de alguma dor. No peito e ao lado esquerdo da alva camisa o sangue se tingiu forte, vibrante, vermelho. A certeira bala do soldado apenas destruíra o coração, aliás, parte dele, mas manteve intacta a cabeça, o intelecto, o discernimento. Era assim que ele se pensava morto.
Terminado o show assassino as pessoas abandonaram as arquibancadas pulando degrau por degrau.
La fora o dia ardia esplendoroso enquanto nos céus os abutres esperavam pelo descuido dos militares para se saciarem naquele corpo.Talvez varassem-lhe o cérebro com as bicadas, porém agora e sem vida não faria a menor diferença. Sim, o povo questionaria e cochicharia um levante, algo que o levasse às ruas. Porém o inconformismo com a ditadura é algo mais filosófico que a questão do enfrentamento. Geralmente o povo não quer saber disso, lutas, armas, tiros, assasinos. O povo está mais preocupado com a compra do supermercado que propriamente ao regojizo de saber que uma bala se cravou no cérebro de um ditadorzinho qualquer.
À saída da arena bancas de pastel e de lanches de mortadela e linguiça calabresa faziam suas promoções. Ao lado delas, numa grande caixa de isopor abarrotada de pedras de gelo três garotos da pesada vendiam coca-colas pet e cervejas Kaiser de três reais a latinha.
No sede do poder, independentemente dos problemas da nação o imperador jogava uma partida de xadrez como a sua Ministra da Cultura.
Seria um longo jogo de dois péssimos jogadores.
Copirraiti03Out2012
Véio China©
Um comentário:
hahaha, mas que falta do que fazer.
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