sábado, 13 de novembro de 2010

A estória mais espetacular dos últimos tempos!

Cheguei em casa passava das sete da noite. O dia fora exaustivo naquele sol de verão onde à sombra chegou-se a mais de 35 graus. Correndo de um lado para outro em estações do Metro apinhadas de gente, pressa, muita pressa, unicamente pressa é o que se via no olhar e andar das pessoas. São Paulo se tornava cada vez mais desumana e amada.
Entrando em casa, com a ponta do sapato direito fiz pressão sobre outro calcanhar, livrando-me do sapato do pé esquerdo. Com o pé desimpedido procedi da mesma forma com o outro, ganhando assim a liberdade condicional; Sim, condicional sim! Afinal, tudo na vida não é condicional?  Tudo que nos cerca é condicional. Respiramos até termos força e ar em nossos pulmões. Enquanto formos potentes teremos relações sexuais. Inclusive até o amor é condicional; não amamos até se findar amor?  Aliás, talvez aí resida um erro de avaliação; Talvez o amor flutue nas nuvens da transitoriedade e não num deserto de condicionamentos.

Desapertei-me da cinta, do nó da gravata e lá estava eu em cuecas na sala de estar. Utopia era denominar aqueles seis metros quadrados como sendo uma sala de estar. Mas como é chique se referir a ela dessa forma, então eu digo de boca cheia; eu tenho uma sala de estar!
Jogados em cima do sofá deixei a minha calça de tergal risca de giz e a puída camisa branca de mangas longas que me acompanham por uns bons anos.. Inspeciono o local e na mesinha de centro percebo uma crosta no vidro. A sua tonalidade de um cinza esverdeado não me deixou dúvida; “O filho da puta do Alfredo andou cagando por aí!” Resmungo comigo ao curvar-me e observar atentamente o empastamento em alto relevo.

-Alfredo! Onde você está? – Vocifero Se eu o conheço bem ele não tardará a se manifestar

-Currupaaa! Currupaa! Aqui! Aqui! – Ele da sinais de vida ao sair detrás de um Buda; um bibelô de mais ou menos 15 centímetros de altura por 25 de largura. Eu nunca soube quais eram os seus motivos, mas, Alfredo sempre foi fissurado pelo gorducho.

-Alfredo, seu mini urubu tingido de verde! Vem aqui com o papai! – Eu o provoco

-Urubu verde! Urubu verde! – Ele repetiu ao voar para o meu ombro esquerdo.

Eu e Alfredo éramos do tipo "bom camarada" E desta longa convivência sobreviviam gostos que nos mantinham unidos, tais como ao amor ao mesmo time e a profunda admiração pela música de Tchaikovsky.   Geralmente os humanos se derretem por seus canídeos, felídeos, fazendo deles o seu bicho de estimação, quando não a extensão de suas próprias famílias.  Comigo não tinha essa! Eu sempre preferi os psitacídeos; jamais um cão uivará um “Currupa”, latiria um "filho da puta" ou gostaria de música clássica.

E assim com a mascote em meu ombro me dirigi à cozinha, abri a geladeira e peguei a garrafa de água mineral gasosa e a emborquei num longo gargalo. Isso pareceu ter incentivado Alfredo.

-Vodka! Vodka! – Falou tão rápido quanto suas patas que iam num daqui pra la, de la pra ca em minha musculatura.

-Isso não é vodka, seu filho da puta! É água mineral com gás! – Para o Alfredo, tudo que se mostrasse líquido e incolor tinha um nome; vodka.

O papagaio tinha uma facilidade estupenda em aprender coisas, por isso eu estranhava o fato dele não conseguir assimilar o “ah” que em vão eu tentava ensinar-lhe.
E isso me deixava perplexo, pois o que seria um “ah” diante das falas dificílimas que ele produzia? Até alguns nomes próprios o Alfredo falava!
Bem, também isso não tinha importância agora.  Saciado da minha sede devolvi a garrafa à geladeira e me dirigi ao quarto. O que falar de um quarto que mede 2,5 X 2,5?  Absolutamente nada!
Ao entrar percebi que a luz de alerta da secretaria eletrônica mantinha-se piscando, portanto havia recados para mim. Olhei no visor e havia somente um. Apertei o botão de mensagem:

-Véio, preciso falar com você, urgente! O assunto é de extrema importância! – Disse a voz quase em súplica. Aliás, não era uma voz qualquer, e o timbre um tanto afrescalhado logo o denunciou – Assim que chegar, por favor, me ligue! – Ele pediu no final da gravação.

Gigio era o seu nome. Eu o conhecera há uns bons anos. Gigio era o dono de uma produtiva comunidade de Orkut, denominada Bar do Escritor. O Bar era um local virtual voltado à literatura e que abrigava milhares de escritores que lá postavam seus textos para as críticas dos demais. Peguei o telefone e me dirigi à sala e liguei a TV.

..... “A presidenta eleita Dilma Houssef prevê um 2011 com significativos avanços para a classe trabalhado..... – Não deixei o repórter da TV Globo terminar reportagem. Com o controle remoto em mãos apertei uma tecla e mudei de canal.  
... –“Foi sem querer querendo! Ele falou para o senhor Barriga. Eu também não sabia dos motivos que me faziam adorar os personagens do "Chaves", principalmente o seo Madruga. Dei algumas boas risadas, porém o meu pensamento estava voltado para o recado no telefone. Será que seria dinheiro emprestado? Fiança em contrato de aluguel? Aval em Nota Promissória? Bem, eu não sabia. E Não sabendo eu tinha que estar preparado. Peguei novamente o telefone, diminui o volume da TV e pressionei algumas teclas. Dois toques. No terceiro, atenderam.

-Gigio?

-Fala Veio! Pegou meu recado, né?

-Parece que sim! – Respondi laconicamente a sua pergunta imbecil. – Então continuou:

-Véio, como você está comigo há uns bons anos, e por respeitar a sua experiência queria a sua opinião em algo que to pretendendo fazer.

-Sim, e qual é?

- Sabe esse treco de vender cachaça em balcão pra poetas não ta dando muito certo. Esse mundo literário é excessivamente ególatra e nada lucrativo – Disse-me ele.

-Sim, e daí? – Perguntei.

-Daí que to pensando em mudar o ramo. Fazer do Bar do Escritor um Clube de Mulheres e de Homens! – Respondeu eufórico.

-Como assim? Não to entendendo completamente!  – Repliquei

-Assim, eu explico,Veio! Segunda, quarta, sexta e domingo, Clube das Mulheres...Terça, quinta e sábado, Clube dos Homens!

-Sim, mas... O que isso quer dizer, Gigio? – Eu não estava alcançando aonde ele queria chegar.

-Calma! Eu chego la! O que eu quero dizer é que convidarei alguns escritores para estrelarem os shows! Claro, mediante uma participação financeira, é óbvio! –

Meu Deus! Aquele cara só poderia estar louco! – Pensei – Ele estava excitadíssimo

-Veja, Veio. Imagine que bacana seria se nos fizéssemos shows de Pole Dancing. Imagine as meninas em lingerie negras, no mastro de metal dando voltinhas, subindo, descendo, fazendo bocas e caretas! – Ele exclamou com um entusiasmo que há muito eu não ouvia.

-Gigio, por Santa Filisbina! Você está bem? – Com muito custo consegui me expressar.

-Claro que to, Veio! Imagine a Barbara, Maria Julia, Michelle, Magmah, Cristina, Cris, Lena, Yvana, Hadassa, Michelle, Mare, Juleni, Márcia, Ruth, Liz, Olga e mais uma pancada de garo...

-Epa...opa! – Eu interferi -. Você só pode estar batendo estacas! Márcia, Ruth. Liz e Olga são damas de alta estirpe. Algumas são casadas, têm filhos. Uma é até avó! Duvido que elas se prestem a essas coisas! – Revidei na tentativa que enxergasse a quimera que se entregara.

-Será que não topariam? – Surpreso, e pra não fugir do padrão ele respondia com uma nova pergunta.

-Claro que não, porra! – Da onde você tirou essa idéia, Gigio?

-Bem, tudo bem, vá! A Márcia a gente coloca na bilheteria. A Ruth assume o cargo de diretora de palco. A Olga, a gente registra como redatora chefe.

-Registrar? Redatora chefe? Redatora de que? – Questionei

-Ah! É que ainda não te falei tudo! É que to pensando também em produzir um teatrinho erótico - Disse numa cara bem safada.

Eu simplesmente não pude acreditar no que ouvia.

-Bom...e a Liz? – Respondi impaciente, dando corda para ver até onde iria a sua insanidade.

-Bom...a Liz...a Liz...bem, na peça a gente da pra ela o papel de “tia das meninas"

-Heim? O que você disse Gigio?

-Isso mesmo que ouviu, Veio. E além do mais, ela leva jeito para esse papel.  Você nunca reparou no seu ar de autoridade?

-Sei, sei! Traduzindo; na tua peça a Liz seria a dona do bordel! !  

-É! É isso mesmo! Dona do bordel! – Ele exclamou satisfeito

-Puts! Só me faltava essa! – Respondi com certo desânimo. – E você ainda quer um show só com os homens? - Emendei

-Sim, claro! Quero o show com os rapazes, também. To pensando neles na barra de metal. Imagine o Allan e seus longos cabelos numa sunguinha fio-dental, branca! Ele, Gutemberg, Sacharuk, Daniel, Axl, Zulmar, Cruz, Lanoia, David, Tiago, Calaça, Edy e tantos outr... – Novamente fui obrigado a interrompê-lo:

-O Calaça? Com aquele corpinho esbelto que ele tem? Cheirou Água Raz, Gigio?

-Puts! É mesmo, ele é excessivamente forte, né? Bem, então pra ele não da. Mas... não é o Calaça que mexe com teatro? 


-Sim. O Calaça mexe com peças teatrais. E daí?

Então, Veio! O Calaça pode ser o diretor da companhia. - Respondeu eufórico. Parecia que seus olhos saltariam das cavidades oculares a qualquer momento

-Ta bom! – Acabei por concordar – Eu estava doido pra terminarmos aquele papo de gente biruta. Além do mais, que eu poderia fazer numa circunstância daquela?  Meter-lhe camisa de força? E se ele fosse do tipo agressivo?

-Viu Veio? Não é mesmo uma idéia genial? – Perguntou-me com certo convencimento.

-É... Mas... é melhor saber agora; você  não poderá contar com o Edy – Centifiquei-o.

-Ué! Não poderei contar por quê? – Novamente a miserável mania de responder-me com uma pergunta.

-Porque pegaria muito mal! O Edy tem uma caveira do Edie, do Iron Maiden, tatuada na em nádega esquerda! E isso desanimaria qualquer público feminino, exceto essas garotinhas que andam de negro e curtem heavy metal. E convenhamos... é um público bem diminuto

-Ah! É verdade! Aí num dá mesmo – Se ainda fosse a tatoo da Lady Gaga, até que passava! – Ele concluiu num profundo suspiro.

-É... – Concordei.

Mantivemo-nos em silêncio por alguns instantes. Eu apenas ouvia a sua ofegante respiração; certamente ele devaneava outras soluções.  O silêncio perdurou enquanto o Alfredo me olhava com certa desolação; E era como se aquele filho da mãe percebesse aquela loucura toda..

-Ah, Alfredo! Que bobagem a minha! Imagine se você teria a compreensão dessa piração toda?  Disse-lhe enquanto sentia os seus pés indo e vindo no meu ombro.

Foi então que envergou as asas e soltou a voz de uma forma que eu nunca ouvira;

-Dá licença, chefe filho da puta? Vocês são tudo porra louca! E o Gigio é gay!

Atônito eu o ouvi. Era a primeira vez que Alfredo não citava palavras isoladas. A primeira vez que ele formara frases e com raciocínio. Vencida a perplexidade veio a vontade de rir. Eu ri e gargalhei até provocar-me dolorosas contrações abdominais.  
Do outro lado da linha alguém berrava descontrolado, insano, desvairado:

-Veiooooooooooo, seu filho da puta! Eu ainda como a rabo desse teu papagaio!

Copirraiti Nov2010
Veio China ©


-

Um comentário:

Giovani Iemini disse...

hahaha, tu tá comendo cocô, véio. tá bebendo shampu e babando mingau.
história engraçada.